7º TRABALHO
O TOURO DE CRETA
O Mito
Creta é uma das muitas ilhas gregas – das mais importantes – no Mar
Mediterrâneo. É, hoje, um bem movimentado centro de visitação turística, onde
as suas milenares ruínas remanescentes de um glorioso passado, cercadas pelo
deslumbrante azul das águas do Mediterrâneo, atraem a admiração de quantos ali
vão a negócios ou a passeios.
Na Hélade, como então era chamada a Grécia Antiga, a Ilha de Creta
graças à sua privilegiada localização no então chamado mar Egeu, era um
importante centro de navegação e comércio. Sua população campesina limitada por
terras de topografia ondulada, ocupava-se da agricultura de subsistência e do
pequeno pastoreio de gado. Era governada, nessa época, pelo rei Minos,
considerado um bom administrador e bom legislador. Ao contrário da maioria dos
outros reinos, em Creta, mercê de uma administração eficiente, imperava a ordem
e o respeito no trato das coisas públicas. A população cretense vivia em paz e
tranquilamente, sem os temores que atormentavam as populações dos demais
reinos, sempre ameaçadas de saques e assaltos de bandoleiros que infestavam as
estradas dos reinos vizinhos. Minos organizara uma eficiente milícia real que
após enormes esforços conseguira afugentar do seu reino os assaltantes e
bandoleiros que por ali apareciam.
Sua fama como bom administrador extrapolou as fronteiras do reino
cretense, espalhou-se pelos demais reinos e fez nascer em Minos um enorme
sentimento de vaidade que passou a manifestar-se em todos os seus atos e
hábitos. Empolgado com sua boa imagem de homem público espalhada por todos os
reinos, resolve, então - vaidoso – fazer uma incursão pelos domínios dos
deuses. Num momento de vaidosa exaltação, cercado por seus cortesãos e
admiradores – e querendo mostrar prestígio junto aos deuses – declara que
sacrificaria em homenagem a Posseidon, o deus dos Oceanos, todas as coisas
belas – por mais valiosas que fossem – que saíssem do mar.
Posseidon toma logo conhecimento da declaração de Minos (os deuses tudo
sabem), conhece também as reais intenções e, obviamente, sua falsidade.
Resolve, então, aplicar uma boa lição no vaidoso Minos.
Era Minos, um fanático criador de gado de raça, puro-sangue. Não possuía
ele um grande rebanho, porque a sua preocupação era quanto à pureza das raças
do rebanho que possuía. Eram, os seus animais, os melhores, os mais perfeitos
de todo o reino e um dos melhores de toda a Grécia. Nas grandes exposições de
gado que regularmente aconteciam, eram sempre os seus animais os mais
premiados. Onde quer que houvesse um touro reprodutor com características
raciais mais completas, Minos mandava comprar, a qualquer custo, por qualquer
preço, para melhorar sempre o “pedigree” do seu rebanho. De todas as partes da
Grécia chegavam sempre outros criadores – também fanáticos e entendidos da área
– para contemplação dos animais de Minos! E isso fazia crescer, ainda mais, a
sua enorme vaidade.
Numa tarde em que passeava pelas tranquilas praias do seu reino, Minos
vê surgir das profundezas do mar, um belíssimo touro branco. Tão alvo que,
inicialmente, confundira-se com as brancas espumas das águas azuis do mar
Mediterrâneo. Minos para, perplexo, a contemplar o lindíssimo touro que, manso,
deita-se aos seus pés. Deslumbrado com a enorme beleza do touro, observa que
todas as características raciais em um puro-sangue sonhadas por todos os
criadores; geneticamente procuradas – e jamais conseguidas – por dedicados
técnicos, estavam ali, reunidas naquele touro! Ele era a própria perfeição na
pureza de sua raça! “Com este touro no plantel, o meu rebanho será,
absolutamente, o melhor de toda a Grécia”, pensou, logo, Minos.
Lembra-se então da promessa feita a Posseidon e tratou de encontrar um
“jeitinho” para contornar a questão. Manda que o touro seja incorporado aos
seus rebanhos e, do seu rebanho manda vir um outro touro, também branco, bonito
e alvo e o sacrifica em homenagem ao deus Posseidon.
Posseidon irritado com a traição de Minos, enlouquece o touro que,
furioso, irrompe pela ilha, dizimando todos os rebanhos, devastando as
plantações. Ninguém consegue pegá-lo, tal sua fúria e força. E, no reino de Creta,
o que antes era ordem, transforma-se em desordem, num caos. Os bandoleiros
voltam a infestar as estradas e os assaltos e saques recomeçam. Minos perde a
fama de bom administrador e é ridicularizado nos reinos vizinhos. Até a sua
própria mulher, a rainha Pasífae, não quer mais saber dele. Apaixona-se pelo
touro. E por mais que procurem o touro – por toda parte – ele não é encontrado.
Mas, por onde passa deixa a marca da sua devastação.
O rei Euristeu, em Micenas, sabe da existência, origem e beleza do touro
de Creta e manda chamar Hércules que descansa meditando, pensando, refletido,
nas pradarias do interior do reino. Hércules apresenta-se a Euristeu e este lhe
diz:
- Vá a Creta e me traga este touro! Mas antes, amanse-o!
Hércules não contesta. Humildemente baixa a cabeça e sai de palácio. Vai
meditando, pensando, refletindo no que o espera nesta sua nova tarefa.
Primeiramente terá ele de atravessar o Peloponeso para chegar à ilha de Creta.
Chegando a Creta, procura por toda parte o touro, sem encontrá-lo. Corre toda a
extensa ilha, percorre todos os campos – devastados – mas o touro não encontra,
por mais que o procure. Resolve, então, Hércules, conversar com Minos para
saber onde está o touro. Minos confirma a loucura do touro, continua a admirá-lo,
mas também não sabe onde ele se encontra, e se recusa colaborar com Hércules.
Meditando, pensando, refletindo em como encontrar o lindo touro,
lembra-se Hércules que ele fora um presente dos deuses – de Posseidon – e,
portanto, somente os deuses, saberiam onde ele deveria estar. Recordou-se ainda
que ele, Hércules, já houvera pedido ajuda a Zeus e fora atendido. E então pede
a Zeus que lhe ajude encontrar o Touro de Creta. No decorrer de alguns dias –
enquanto meditava – lindo, alvo, completamente manso, aparece-lhe o touro e
deita-se aos seus pés.
Hércules depois de agradecer em contritas preces e mantras a recebida
ajuda, monta no touro, atravessa nele montado o então mar de Creta, hoje
Mediterrâneo, e o entrega, manso, a Euristeu. Desta vez Euristeu não se esconde
(morrendo de medo) no vaso de bronze. Ele, que também era criador de gado de
raça, recebe o touro e, igual a Minos, manda colocá-lo nos seus estábulos,
junto aos seus rebanhos. Mas o touro torna a enlouquecer e destrói todo o
rebanho de Euristeu. Hércules apieda-se da situação do touro, pega-o e o
oferta, de presente, à deusa Atena. Ela vibra energia divina no touro,
amansando-o e o reintegra ao rebanho dos deuses.
Simbolismos e Ensinamentos
É a vaidade, um dos grandes males que acomete o ser humano. Pode atacar
– e sempre ataca – pessoas portadoras de ótimas qualidades e virtudes. Minos
era bom administrador e legislador, portanto uma pessoa de conhecimentos;
honesto – no seu reino imperava a ordem e o respeito no trato das coisas
públicas; conseguira o feito, difícil, (tendo em vista o contexto da época, e,
até mesmo hoje em dia, como se vê), de expulsar do reino todos os assaltantes e
saqueadores. No seu reino todos trabalhavam – tranquilamente – nos serviços de
pastoreio, na pequena agricultura ou nas ocupações ligadas ao mar.
Minos, mesmo possuindo tais qualidades, deixou empolgar-se pela vaidade.
Movido por ela tenta ultrapassar seus próprios limites, e vê ruir,
repentinamente, toda a imagem – fantasia – de seu próprio julgamento. Pensando
enganar os deuses, gerou Minos, para si, como ser humano, carmas de retorno
imediato. Como governante criou um carma coletivo, desestabilizando todo o
reino e trazendo infelicidade para a população. Porque existe uma relação
cármica entre governantes e governados, sendo bem mais profunda a verdade que
existe na afirmação (atribuída a Ruy Barbosa quando perdeu as eleições
presidenciais para o Marechal Hermes da Fonseca, em l910), de que,“cada povo
tem o governo que merece”. Por extensão, poder-se-ia afirmar: cada povo – e ser
humano – tem o que merece ter! Não se deve esquecer, porém, que o carma (ação)
é uma lei de causa e efeito. Cada povo tem o governo que merece ter. Se, porém,
o governo não é bom, é porque falta, ao povo, o necessário discernimento para saber
distinguir o joio do trigo, no ato de escolha dos seus governantes. E esse
discernimento – em nível pessoal ou coletivo – somente aparece após um penoso
caminhar de sofrimentos, desencontros e provações, como acontece com as nações,
nos seus processos de desenvolvimento.
O que ocorreu com Minos acontece todo momento com muitas pessoas
possuidoras de boas qualidades e detentoras de grandes conhecimentos. Possuem,
tais pessoas, boa parcela de informações e de conhecimentos das leis ocultas
(familiaridade com as coisas divinas), mas não sabem aplicar, na prática, a
sabedoria, a humildade que essas leis ensinam. Tal qual o rei Minos, tentando
aparentar uma intimidade – que não existe – com as hierarquias divinas,
encastelam-se numa torre de vaidades como se tais conhecimentos fossem uma
propriedade particular, de acesso privilegiado na área dos deuses, onde somente
eles – os “minos” dos nossos reinos – pudessem lá chegar. E, pela vida afora,
cercado de cortesãos e admiradores, na vaidosa exaltação de suas fantasiosas
elucubrações, vão ferindo as mais refinadas energias divinas, deformando, na
prática, o aprendizado da humildade contida nos ensinamentos divinos e muito
dificultando o acesso de tantos quantos buscam, sedentos, a límpida fonte do
conhecer e do saber.
Se, “trato é trato! E é para ser cumprido!” como disse Hércules ao rei
Áugias (no trabalho anterior) para forçá-lo a cumprir o que prometera, o que
dizer, agora, de uma promessa feita pelo rei Minos a um deus, Posseidon?!
Quando Minos declarou que sacrificaria em homenagem a Posseidon, todas as
belezas saídas do mar, ele fez uma promessa. Comprometeu-se a cumprir o pacto
que fez com um deus. Se um pacto – um trato – feito entre humanos deve ser
cumprido em obediência à lei da verdade cósmica, como descumprir um pacto feito
com Deus; como desrespeitar a Sagrada Aliança?
Ensina Hermes, o Trimegistro, (o três vezes grande) como o chamavam os
gregos, que, “o que está em cima é igual o que está embaixo”. Esta é a Lei do
Princípio Único que abrange o cosmos inteiro e faz com que o comportamento e
forma de todos os seres e coisas existentes no universo sejam regidos pelas
mesmas normas, seguindo idênticos princípios, obedecendo às mesmíssimas leis.
Quer seja no macrocosmo, onde os grandes corpos celestes, as imensas galáxias e
imagináveis estrelas e astros se espalham, ou, no microcosmo, desde o menor e
mais insignificante micro organismo (germe, bactérias, vegetais, minerais,
animais, passando pelo ser humano com todo o seu complexo sistema biológico,
fisiológico, mental), todos obedecem a um “Princípio Único” e por este
princípio somos todos regidos. Portanto, “trato é trato! E é para ser
cumprido!” - Representa a prevalência da verdade. E a verdade tem a força de um
decreto cósmico. É a presença da Aliança de Deus com os homens. Minos não
cumpriu a promessa que fez a Posseidon e, por isso, conheceu a cólera do deus,
representada na loucura do touro de Creta, na destruição dos rebanhos e na
devastação da cultura vegetal de Creta (o poder material de Minos).
As forças divinas nos ajudam, socorrem-nos quando, aflitos, imploramos
ajuda. Mas devemos, também, cumprirmos com as nossas obrigações – neste pacto -
perante as leis cósmicas, com práticas de serviços religiosos, trabalhos de
ajuda o próximo, hábitos de vida piedosos, comportamentos sempre voltados para
os valores espirituais. Enfim, pautarmos uma vida de modo a termos o direito de
esperar a ajuda divina, nos momentos em que dela necessitarmos.
(Por que Posseidon escolheu um lindo
touro para testar as intenções de Minos?)
É uma escolha aparentemente estranha para testar a fidelidade de um rei
a um deus. No presente caso, entretanto, demonstra a presença de uma enorme
acuidade. Digna mesmo da sabedoria de um deus. Para um criador, fanático, de
gado de raça – como o rei Minos – um touro puro-sangue perfeito em sua raça, é
como uma jóia de rara beleza; é como uma obra de arte de uma coleção! - “Não há
preço que pague” – costumam dizer. Nas exposições de gado (interesses
comerciais à parte, para as vendas de sêmem, hoje muito difundidas com as
inseminações artificiais), curte o feliz dono do animal exposto, a vaidade de
possuir aquela obra-prima da natureza, por todos os entendidos – doutores em
genética, especialistas no assunto – contemplada. Posseidon, um deus, portanto
um profundo conhecedor das fragilidades humanas, soube bem explorar o mais
vulnerável ponto de vaidade de Minos, com o lindo e perfeito touro de Creta.
(Por que Hércules procura o touro em
toda parte, em Creta, e não o encontra?)
O touro veio – foi um presente de Posseidon – para ser imolado no altar
dos sacrifícios, como prometera o rei Minos. O não cumprimento da promessa - do
trato - de Minos para com Posseidon, quebrou o pacto e anulou o sentido do
presente divino que o touro representava, e, portanto, o touro desapareceu. O
presente deixara de existir. Restou, tão-somente, as marcas da loucura do touro
– as devastações – a deformação da natureza do presente divino – o touro. Um
presente divino – uma dádiva – é feita ao ser humano para aplicação de modo
correto, com finalidades específicas; não para ser esbanjado ao bel-prazer dos
caprichos e das vaidades humanas. Como ostentação, como luxo e exibicionismo.
(Por que Minos se nega a colaborar com
Hércules para a captura do touro?)
Porque Minos não tinha a menor ideia onde o touro se encontrava. Somente
os deuses sabiam onde estava o touro. E Hércules, graças ao seu nível de
evolução espiritual e de conhecimentos na senda da espiritualidade, percebe que
somente os deuses o poderiam ajudar a encontrar o touro. Lembrando-se que já
fora socorrido antes, no trabalho das Aves do Lago Estínfalo (e aqui está a
experiência de um episódio do Mito ajudando para a solução de um problema de
outro episodio, como acontece com frequência em nosso dia a dia). E a ajuda
vem, trazendo o touro, manso, para Hércules, portanto sem as deformações da
natureza divina criadas por Minos quando deturpou as finalidades para a quais o
touro foi enviado. Agora, volta o touro com outra finalidade, específica, para
ser entregue a Euristeu.
Porque, à medida em que nós vamos mantendo contatos constantes com as
energias divinas, vamo-nos aproximando dos planos superiores e tornando-nos
mais sensíveis às mensagens espirituais. E, mais dias menos dias – a depender
do nosso nível evolucionário – passaremos a, conscientemente, sentirmos a
presença da divina energia. Perceberemos, então, o elo que nos liga ao Grande
Ser Primordial que é o Pai Celestial, e, então, encetaremos a nossa caminhada
na senda da imortalidade, como está fazendo Hércules, e todos nós, também.
Por outro lado, à medida em que vamos tendo contatos com as energias de
planos inferiores, vamos adensando os nossos sentimentos e nos afastando dos
valores espirituais. Daí o cuidado que devemos ter sempre em relação aos lugares
por onde andamos, com quem andamos e como andamos. Devemos estar sempre
vigilantes para não permitir que sejamos envolvidos pelas camadas das densas
energias anticrísticas.
(Euristeu coloca o touro junto com o
seu rebanho, o touro volta a enlouquecer e destrói todo o rebanho de Euristeu.)
Por quê?
Porque Euristeu embora não tivesse morrido de medo na chegada de
Hércules desta vez, nem corrido para esconder-se no vaso de bronze, ainda não
possui um nível evolutivo para entender que um presente dos deuses – o Touro de
Creta – não deveria ser misturado com os seus rebanhos. Um presente dos deuses
– uma dádiva celeste – deve ser adorado, contemplado, colocado no ponto mais
alto no altar de nossas devoções. O Touro veio para Euristeu numa tentativa dos
deuses para que ele, vibrando com a beleza do Touro (ele gostou do Touro, não
teve medo, não se escondeu para proteger-se) pudesse vislumbrar ali (e ele
sabia ter sido o Touro um presente de Posseidon a Minos) a beleza da criação
divina e contemplando-a, aproximar-se de Deus.
Euristeu, como o rei Minos, não entendeu a divina intenção. A destruição
dos seus rebanhos pelo touro foi mais uma lição que Euristeu recebeu e que irá
contribuir para que um dia, conscientemente, ele também inicie a sua caminhada
na busca da imortalidade. Todos nós chegaremos lá. É só questão de dias...
anos... séculos... milênios... A depender da evolução espiritual de cada um...
O número 7 (o 7º. Trabalho de Hércules) simboliza a setenária condição
do ser humano. O 7 significa a interação dos 4 corpos inferiores (físico,
astral, mental e etérico) – matéria – com os 3 corpos superiores (espírito) que
são o Cristo Pessoal, o Corpo Causal e a presença do EU SOU. O Touro de Creta,
presente dos deuses – dos Planos Superiores – representa a formalização dessa
união – do pacto entre Céu e Terra – que Áugias e Euristeu não entenderam. E
atiraram “pérolas aos porcos!”
Hércules condói-se da loucura do touro, e o oferece de presente à deusa
Atena, porque sendo ele de origem divina, retorna à sua origem. Recebendo as
vibrações da deusa, o touro elimina em si as deformações sofridas com a mistura
das densas energias dos rebanhos terrenos e é reincorporado aos rebanhos dos
deuses, no Olimpo. Mas deixa na Terra o seu filho, o famoso Minotauro, (Mino+Tauro=
Minotauro) monstro com a cabeça de touro e corpo de homem que o rei Minos
mantinha preso no labirinto de Creta.
A LENDA DO MINOTAURO
O Minotauro, um monstro com o corpo de homem e cabeça de touro, era
filho do Touro de Creta e da mulher de Minos, a rainha Passífae que pelo touro
se apaixonou. Vivia, o Minotauro, preso no Labirinto de Creta, construção
encomendada especialmente para ele, pelo rei Minos ao arquiteto Dédalo (pai de
Ícaro, o que voou, fugindo da prisão, numa ilha, usando asas feitas de penas
coladas com cera. Animado com o voo, subiu muito alto. A cera se derreteu com o
calor do sol, as asas se desfizeram e ele caiu no mar de Creta, hoje Mar
Mediterrâneo e morreu). O Labirinto de Creta possuía internamente um complicado
sistema de corredores, salas e passagens que impediam a quem ali entrasse
(porque se perdia no intrincado sistema) de encontrar a porta de saída. Porta,
aliás, que não existia. Porque, sendo construído para ninguém sair dele, ali só
havia porta de entrada.
Por essa época os torneios, competições e jogos eram eventos constantes
entre os vários reinos da Grécia. Neles, os jovens gregos iam buscar, para os
seus reinos, os louros das vitórias conseguidas nas arenas esportivas. Dentre
as modalidades disputadas, uma das mais perigosas era o enfrentamento dos
touros, na arena. Havia frequentes acidentes e até mortes.
O rei Minos (de Creta) tinha um filho, Androgeu, que foi morto por um
touro numa competição em Atenas, então capital do reino da Ática. Minos,
furioso, culpa o rei Egeu, da Ática, pela morte do filho. Como o reino de Creta
era bem mais poderoso que o da Ática, exige Minos, como represália pela morte
do filho, que, periodicamente, catorze jovens atenienses, (sete moças e sete
rapazes) sorteados, sejam enviados a Creta, para, no Labirinto, serem devorados
pelo Minotauro. E, todos os anos sempre por ocasião das festas de Creta, um
barco, com velas negras, parte do porto de Atenas conduzindo catorze jovens
atenienses que serão imolados – no Labirinto de Creta – em homenagem à terrível
vingança do rei Minos.
Teseu é um jovem grego, filho do rei Egeu, da Ática, com a princesa
Etra, filha de Titeu, rei de Trezena. Fora criado por sua mãe, sob orientação
do avô. Estudou logo cedo as táticas de guerra e práticas de combate que aprendera
com incrível facilidade. Jovem ainda, tornara-se já um defensor da Justiça,
enfrentando e vencendo saqueadores e assaltantes nas estradas do reino. Na
arena, durante os torneios e competições, o jovem príncipe tirava sempre as
melhores classificações. De porte atlético e belo, possuidor de muita força,
graças aos exercícios que constantemente praticava, somava a força física á
inteligência, que usava com muita prodigalidade. Amado por todas as mulheres de
Atenas, porque se dizia, possuir ele, um jeito próprio de lidar com elas, que
logo as fascinava.
Chegou o dia - fatídico - do sorteio (no caso, do azar) dos jovens
atenienses que seguiriam para a imolação no Labirinto de Creta. A arena, onde,
durante as competições esportivas, vibra numa festiva expectativa de vitória,
nesse angustioso dia, é palco silencioso das dramáticas esperanças de exclusão
nos sorteios. Mães, irmãs, noivas, namoradas e amigos, no paroxismo de
angustiante expectativa, aguardam ansiosos o resultado do sorteio, na esperança
de que seus entes queridos não sejam sorteados. Anunciado o resultado,
relacionado os nomes dos infelizes escolhidos, corre pela imensa assistência, o
triste som de choros e soluços daqueles que verão partir os entes queridos para
alimentar a voracidade do monstro de Creta.
Entre soluços e choros, ouve-se, na multidão, a voz de um jovem que não
fora sorteado. Era a voz de Teseu. Pedia que se fizesse um novo sorteio, agora,
entre os escolhidos. E, que o agora sorteado, estaria dispensado de seguir para
Creta, porque ele, Teseu, iria em seu lugar. E assim aconteceu. Ao rei Egeu,
seu pai, disse Teseu que iria para matar o Minotauro. E convencionou com este
que trocaria as velas do barco que os conduzia a Creta, de pretas para brancas
– se morto o Minotauro, voltasse ele com vida – se não, retornaria o barco com
as mesmas velas pretas que partira.
E assim, na tristeza da despedida dos que não vão voltar, parte Teseu e
os jovens atenienses para Creta, cobertos pelo luto das negras velas da nau que
os transporta. Chegando a Creta é imediatamente iniciado o desfile dos jovens
atenienses, ritual que sempre antecedia à introdução, um a um, diariamente, no
Labirinto, enquanto os demais aguardavam, no barco, cada um, a sua vez.
Durante o desfile dos jovens condenados, a princesa Ariádne, filha mais
velha de Minos, vê Teseu e, fascinada pela beleza dele imediatamente por ele se
apaixona. Fala-lhe do seu amor e propõe salvá-lo, mas quer em troca que ele a
leve consigo. Para que ele pudesse sair do Labirinto, existia um único meio que
fora ensinado a Ariádne por Dédalo, o arquiteto projetista do Labirinto, e que
ela ensina a Teseu: dá-lhe um carretel de linha finíssima, mas muito
resistente, que ele deveria amarrar a ponta logo à entrada do Labirinto e ir
desenrolando o fio à medida que fosse passando nas incontáveis voltas lá
dentro. Para sair, era só acompanhar de volta o fio que chegaria à entrada (no
caso à saída).
Munido desse carretel e de uma faca que trouxera escondida, oferece-se
Teseu para ser o primeiro a entrar no Labirinto e logo nessa mesma tarde, lá é
introduzido. Amarra a ponta da linha na porta de entrada e vai sorrateiramente,
de faca em u’a mão e carretel na outra, desenrolando-o cuidadosamente e
avançando por aquele emaranhado de corredores, galerias e salas. De repente,
ouve um ruído de passos em sua direção e põe, cuidadosamente, o carretel no
chão. Faca escondida debaixo da roupa, tenta esconder-se em um canto, mas é
visto pelo Minotauro. Ao ver o monstro, Teseu – um mestre na arte do combate –
observa logo os pontos fracos do inimigo. Era o Minotauro extremamente forte,
mas pesadão, gordo, (resultado de anos ali encarcerado, alimentando-se
fartamente, sem nada fazer). Na luta, percebe logo Teseu, ele teria a vantagem
da agilidade, e a tática a ser usada seria a de não se deixar envolver por
aqueles possantes braços.
O monstro, ao vê-lo, tenta agarrá-lo, mas Teseu sai, taticamente, do
apertado corredor em que se encontra e corre para uma sala, ao lado. Precisava
de espaço para não se deixar agarrar pelo monstro. Nova investida do Minotauro
– agora já na sala – e Teseu, novamente se desvia, sem, entretanto, abandonar a
luta. A tática de Teseu é não deixar o monstro descansar. O Minotauro, sem
perceber a intenção do inimigo e cada vez mais encolerizado, vai tentando
agarrar Teseu e aos poucos vai se cansando. Quanto mais encolerizado, fica o
monstro mais cansado e vai Teseu instigando-o ao combate. Num ímpeto de fúria,
sem perceber a faca de Teseu, sempre escondida – acostumado a atacar as suas
vítimas sempre desarmadas – avança, pesadão para Teseu e na ânsia de agarrá-lo,
abre os braços, deixando, completamente desprotegida a sua região cardíaca. No
exato momento – tecnicamente ideal – crava-lhe Teseu com a sua faca, certeiro
golpe no coração, prostrando-o morto. Apanha, então, o carretel e guiando-se
sempre pelas passagens do fio por ele desenrolado no carretel em sua vinda,
chega à porta de saída (de entrada, porque ali não fora previsto saída), do
Labirinto, onde Ariádne ansiosamente o espera. Anoitece...
Embarcam os dois, e zarpam rumo a Atenas. Além deles, vão, ali, também,
os outros jovens atenienses salvos da feroz vingança do rei Minos. Enquanto
aquele barco conduzindo os jovens salvos singrava as águas azuis do então mar
de Creta (hoje mar Mediterrâneo), em Atenas o bondoso rei Egeu, pai de Teseu,
mantinha-se noite e dia no alto de um penhasco, à beira do mar. Perscrutava
permanentemente o horizonte para as bandas de Creta, tentando ver ao longe, as
velas brancas que anunciariam a volta do querido filho. Numa tarde, já no
anoitecer, vislumbra ele, lá longe no horizonte, o aparecimento de um barco e
logo o identifica como sendo o que conduzira os jovens atenienses à Creta.
Uma dor profunda invade aquele amoroso pai. O seu velho coração parece
que vai parar de tanto sofrimento! E, no paroxismo daquela insuportável dor,
joga-se ele, lá do alto do penhasco, morrendo no então mar de Creta – hoje mar
Mediterrâneo – que em sua memória passou a chamar-se, a partir de então, de mar
Egeu. Teseu certamente envolvido pelo amor de Ariádne, esquecera-se de mudar as
cores das velas do barco, como fora combinado com o Rei, seu pai!
Ao chegar a Atenas foi Teseu aclamado rei, mas não aceita o trono. Manda
que a população escolha livremente, democraticamente, um governante para aquele
reino. Aceita ficar no comando das Forças Armadas do reino, área em que era,
comprovadamente, um mestre. Foram essas, talvez, as primeiras eleições
governamentais, democráticas, realizadas na Terra!
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